26 de junho de 2007

Prefácio:
Prosa escrita durante muito tempo, possivelmente a mais editada que já fiz, foram 5 versões diferentes até ela. Talvez romântica de mais mas veio de dentro, isso posso garantir.


Casa na Árvore

Eu queria ter uma casa na árvore. Não uma casa de criança, mas uma casa de verdade. E essa casa vem com um brinde, um ótimo brinde. Não um daqueles de Kinder-ovo que quando muito agente põe na estante, mas um brinde que estará sempre comigo.
Nossa casa será toda de madeira. Uma porta de vidro, de correr, dividirá a sala de uma grande varanda com vista para o rio que corre e vai polindo as pedras e o nosso humor. Terão futtons no chão e almofadas espalhadas por eles. Ao lado terão nossos livros empilhados, meio bagunçados mesmo. Terá também uma rede grande para dois. Do outro lado da casa, a cozinha terá uma porta com outra varanda do outro lado dela. Essa em forma de “L” e com vista para a cachoeira, a trilha meio escondida por entre as árvores e a pedra onde nos sentaremos, às vezes, para tardes enfumaçadas. Terá uma bancada no parapeito com duas cadeiras de madeira clara. Terão sinos de vento pela casa toda.
O vento, com sua voz suave, terna e singela, virá nos acordar, fazendo badalar todos os sinos, em nossa cama, entrando pela janela grande entre aberta e húmido pela companhia do orvalho da manhã, seu como meu brinde meu. Nós, acordados e, a essa altura, também húmidos, desceremos a escada a esquerda da porta da cozinha, na parte menor do “L” da varanda, indo para a cachoeira, a alguns passos dali, tomar nosso banho ao som da água batendo e do canto dos pássaros, juntos.
Ao voltar, sentados no deck com os pés pra baixo, a balançar, já secos pelo calor e pela brisa da manhã, tomaremos nosso café da manhã de sucos, frutas, leite e o que mais desejarmos. Depois, esparramados pelos futtons e almofadas, nos entregaremos a nossas leituras trocadas. Leituras de Drummond, Fernando Pessoa, Verissimo, Jorge Amado, Neruda...
Dali a algumas horas, quando a fome vier fazer roncar nossos estômagos ou o desejo vier fazer-nos salivar, prepararei sushis e sashimis de peixes do rio, comprados na peixaria da pequena vila a mil metros de casa.
Estômagos calados, deitados na rede, tiraremos nosso cochilo vespertino, ao som de alguma música que eu cante, sorrindo, como sempre. Cairemos no sono embalados pelo cheiro das rosas rosas das roseiras e dos brancos jasmins dos jasmineiros.
Com a tarde a cair o frio virá, mas o calor de nossos corpos nos basta. Entregues ao sono, sonharemos. Mas sonharemos com que? Sonharei com você porque, mesmo tendo meu brinde ao meu lado, nunca me cansarei de sonhar-te.
Acordaremos antes do anoitecer só pra ver o sol se pôr por de traz da das árvores que margeiam o rio. Não conseguirei olhar o sol, a não ser pelos teus óculos escuros e pelo laranja de teu sorriso. Seus olhos, por traz dos óculos, às vezes olharão os meus meio bobos com o laranja dos teus. Eles te observarão, por traz das lentes verdes, alaranjadas, até que as estrelas venham nos cobrir.
À lua cheia conversaremos, dos assuntos mais bobos à literatura, musica e à discussões políticas.. Conversaremos cobertos pelas estrelas e pela lua plena. Conversas envoltas pela nuvem de fumaça solta por nós dois, sentados nos futtons aos pés do grande narguilê, grande responsável pela fumaça e pelo gosto de maçã em nossas bocas. Gosto do fruto proibido, como diz você.
Conversas e conversas depois entraremos em casa para comer de novo – por pura gula. A comida será regada à vinho. Uma garrafa, talvez, ou mais. Depois de algumas taças e eu com as bochechas doendo de tanto rir e sorrir, voltaremos lá pra fora, para observar as estrelas e São Jorge na lua com seu dragão, em plena batalha, como a lua plena.
Nós, dispersos com as conversas, as risadas, os olhares e os sorrisos, esqueceremos do tempo, perderemos a noção da existência desse imperdoável justiceiro chamado tempo. Então, o toque de recolher será dado pelo rouxinol, galanteador irremediável, que – tentando conquistar a bela andorinha – cantará o canto da mais linda melodia.
Nós, já deitados sob o teto transparente de nosso quarto, sobre nossa cama, dormiremos como que anjos em suas nuvens macias de algodão, sob a proteção plena da lua plenamente cheia e das estrelas à nos observar.
Nossos sonhos serão leves e em tons pastéis ou intensos e excitantes em cores quentes. Felizes seremos, juntos. Seu presente e meu brinde. Juntos.


Presentebrinde, brindepredente.




(Ao meu brinde.)